domingo, 15 de agosto de 2010

O Poder do Obrigado

O Schuster Performing Art Center em Dayton, no Ohio, é um complexo impressionante. Muitas cidades quatro vezes maiores que Dayton não têm ma sala de espectáculos tão boa como aquela. Schuster é um edifício chamativo com tectos abobadados, salas de refeições privadas, salas de ensaios de música e uma sala de espectáculos com uma acústica perfeita que garante a excelência de todos os lugares. No entanto, a verdadeira jóia do centro de artes performativas encontra-se nos bastidores, o seu nome é Kim.
Conheci Kim aquando do convite da Dayton Junior League (organização feminina de carácter educativo e de solidariedade, cujo objectivo consiste em melhorar a comunidade através do voluntariado e formação. A formação é direccionada aos membros da comunidade e tem como objectivo desenvolver as competências destes em práticas de solidariedade e civismo) para ser oradora durante 2 dias no seu Town Hall Lecture Series (sessões de esclarecimento e de promoção de debate organizadas anualmente pelos municípios que têm como objectivo educar e informar os cidadãos sobre diversos assuntos de cariz social e cívico). É sempre um pouco intimidatório falar para estes grupos. Sou frequentemente convidada na qualidade de oradora, mas, apesar de o fazer há muitos anos (e de falar para 5 milhões de pessoas diariamente na televisão), sinto sempre uma certa ansiedade.
[…]
A agradecida Deb – que estava em risco de se tornar na Deb intrometida – resolveu intervir. A minha oportunidade surgiu graças aos sapatos.
As meninas da Junior League estavam vestidas a rigor: maquilhagem e penteados fantásticos, vestidos primaveris bonitos e um calçado da moda. Aqueles sapatos eram incríveis! As oficiais que iam intervir em palco estavam em linha, e era impossível não reparar nos sapatos: altos, brilhantes e muito sexy. As raparigas riam-se sobre as dores que sentiam nos pés, mas todas concordamos: às vezes é necessário sofrer em prol da beleza. Cada uma de nós podia estar em sofrimento, mas sentíamo-nos nas nuvens por calçarmos aqueles sapatos.
Pensei que Kim – com a sua altura e fabulosas pernas longas escondidas por dentro daquelas Levis – ficaria lindíssima calçando aqueles sapatos super sexy. Com algum tempo de sobra, enquanto as meninas da Junior League actuavam em palco, abordei-a. “Estás a permitir que todos estes rapazes te desconsiderem. Só porque eles são rapazes não quer dizer que tenhas que te transformar num. Abraça a tua feminilidade” disse-lhe. “És uma mulher muito bonita, mas estás a esconder esse facto!”
Apontei para as suas sapatilhas. “Esses sapatos por exemplo” e não parei. “Percebo que haja alturas que tenhas de calçar sapatilhas, quando esta para a frente e para trás a montar palco, mas hoje não é um desses dias. O que tens para fazer resume-se a mandares-me para o palco na altura certa.”
Tirei um dos meus sapatos e coloquei-o ao lado das calças. “Vês como estes sapatos ficam bem com essas calças? E essa t-shirt branca é perfeita. Veste um casaco por cima e ficas a Miss Super Chique.” E antes que Kim pudesse vir com o argumento de que “os sapatos são caros”, adiantei-me.
“Olha, não tens de gastar uma fortuna em sapatos. Podes ir à Payless (loja de sapatos, com muita variedade e preços muito competitivos) e comprar uns sapatos fantásticos a caminho de casa esta noite. Ou consulta alguns catálogos. Comprei uns sapatos de pele por 30 dólares! O teu marido não vai reparar que gastaste dinheiro.” Fiz uma pausa para acrescentar intensidade. “Aquilo em que reparará é na mulher extraordinária que vem a caminhar na sua direcção ao final do dia.”
[…]
Olhei para Kim. Ela era mesmo bonita – mas era fácil não reparar na sua beleza. Temi que as pessoas não estivessem a reparar na Kim.
“Promete-me – até ao final da semana – vais experimentar os sapatos. Podes guardar as sapatilhas e calçá-los sempre que for necessário, mas experimenta os sapatos.”
“Veremos…” afirmou com pouca convicção, mas estava a sorrir.

[...]

São agora 12h26, e aqui estou eu sentada enquanto escrevo, com os olhos lavados em lágrimas e o coração repleto de gratidão. Aqueles breves minutos que passei com Kim nos bastidores fizeram uma diferença na sua vida.
Ela conta-me que agora faz questão de dedicar algum tempo a pôr maquilhagem. Diz-me também que de vez em quando se lembra de mim: “A tentar recordar-me que apesar de trabalhar com homens não tenho que me vestir como eles. E por isso, OBRIGADA.”
Não, Kim. Eu é que agradeço. O que a Kim provavelmente não percebe é do quanto ela me deu. A maioria de nós nunca toma conhecimento do impacto que tem na vida dos outros. Simplesmente assumimos que não temos qualquer influência. Kim, obrigada por me lembrares que todos nós, nos momentos mais comuns do dia-a-dia, temos o poder de operar magia na vida de alguém. Esse lembrete é um presente para todos nós - e por isso, estou muito grata.

Deborah Norville – "O Poder do Obrigado"

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